segunda-feira, 21 de novembro de 2011

SOCORRO! Patrimônio histórico em perigo – A casa da Praça 20 de Setembro em São Leopoldo



Velha conhecida da cidade, a casa eclética situada na esquina das ruas Saldanha da Gama com Osvaldo Aranha no centro de São Leopoldo sempre foi um marco referencial na história da cidade. A qualidade e delicadeza de sua modenatura, proporcional e bem desenhada, fazia um interessante contraste com outro prédio de inegável qualidade arquitetônica: a biblioteca pública, prédio modernista situado na Praça 20 de Setembro.
Os dois prédios, de distintas épocas, são de qualidade ímpar dentro das limitações do período e dos seus respectivos programas de necessidades. Duas formas diferentes de conceber arquitetura que, com a proximidade de um olhar, podiam ser fruídos durante um mesmo passeio pela Praça 20 de Setembro.



A excelente localização desta casa eclética também ajudou a colocá-la em evidência: trabalhada em aula durante algumas disciplinas do curso arquitetura da Unisinos, foi recentemente tema de trabalho de conclusão de curso de uma acadêmica da mesma instituição. A cidade acostumou-se a conviver com aquela vetusta construção que, na dignidade de sua fachada marcada pela pátina do tempo, jamais pintada com cores extravagantes ou tintas inadequadas, mantinha-se ainda que abandonada como um marco importante para a comunidade capilé.
As saliências das pilastras, que também ajudam a estruturar a fachada, e os demais ornamentos que emolduram as portas, janelas e principalmente a bela platibanda de frontão arredondado, através dos tempos juntaram tanta sujeira e fuligem quanto histórias e memórias. As casas antigas tem essa propriedade: elas não parecem “reter” a memória dentro de tantas reentrâncias e saliências?
Se os olhares de admiração asseguraram sua manutenção, não conseguiram assegurar contudo sua conservação. Muito degradada, a empresa de transportes coletivos proprietária do bem histórico decidiu solicitar sua demolição. O conselho de patrimônio foi sensato ao negar este pedido, visto que a casa além de tanta importância histórica, arquitetônica e social, está devidamente arrolada em um decreto municipal que impede sua demolição.

Houve acionamento do Ministério Público, mas o caso vem se arrastando há meses. O pior aconteceu: primeiro o desmoronamento parcial do telhado, que já se encontrava em avançada degradação. Após décadas sem nenhum investimento para conservação, é até impressionante a resistência apresentada pelo prédio. Com o tempo, cai todo o telhado, e também o frontão que dava frente para a praça. Quantas memórias não caíram juntas com aquele elemento?
Desde então, o bem agoniza a olhos vistos, diariamente. A casa, em um estado cada vez mais crítico, continua desmoronando, sem escoramento adequado para sua estrutura e sem proteção contra a incidência de chuvas. E principalmente: sofre a falta de luz para que consiga suportar as noites. Explica-se: é curiosamente apenas no breu noturno que as paredes costumam desabar.
A empresa proprietária segue com seu desejo de demolir o restante do imóvel, visando conseguir mais vagas para estacionamento. Não precisamos citar o quanto um muro branco abrigando vaga para um ônibus estacionado seria no mínimo impertinente em um ponto tão nobre e de frente para uma praça pública... E pior ainda, o quão grave seria perder este prédio histórico tão importante para a cidade? Abrindo mais um precedente que desmoraliza de vez a existência de uma legislação municipal e de um conselho de patrimônio?



Mas, que desfecho terá esta história? Os personagens em ação hoje são o tempo, implacável; a empresa proprietária e a promotoria de meio ambiente da cidade. Mas ainda faltam os principais protagonistas sempre que se fale de patrimônio cultural: a sociedade. Sociedade que é convocada pelo artigo 216 da Constituição a colaborar com o poder público pela preservação do patrimônio cultural. Sociedade que é “dona” do patrimônio cultural e dos valores intangíveis que estes bens imóveis são portadores. A população é a principal interessada na manutenção de sua história, de sua identidade, de sua paisagem urbana.


Recorrendo a pensamentos elitistas, podemos pensar que a população não está preparada para assumir um compromisso com seu patrimônio. De fato, hoje a população em geral não apenas está ocupada com o consumo, mas é incentivada a isso pela (des)educação continuada e diária da mídia.
No entanto, o grito de SOCORRO desta casa foi acolhido por 150 pessoas em apenas 2 dias de divulgação boca a boca. Lembramos que essas 150 pessoas também são sociedade. E que a luta continua a ser endossada por mais e mais pessoas, não só leopoldenses, mas brasileiros preocupados com a manutenção do patrimônio cultural.

O estado da casa é lamentável, mas ainda reversível. As partes caídas continuam rígidas e podem ser resgatadas. As ruínas podem ser consolidadas e devidamente restauradas. Não há dificuldades técnicas para a solução do caso: a única dificuldade é a falta que faz uma sociedade ativa, organizada e reivindicadora dos direitos coletivos e difusos. Uma sociedade que demonstre peso, que faça pressão para que valham estes direitos. Que veja que articular a preservação apenas por baixo dos panos não funciona, é preciso atuação transparente e às claras para que se possa congregar o máximo de indivíduos interessados. Penso que este é o caminho mais importante a ser trilhado, e é o que estamos tentando começar com este apelo. Ouçamos o grito de SOCORRO do nosso patrimônio!



Jorge Luís Stocker Jr.

A foto de abertura é de autoria de Sergio Matte. As demais são do autor em 20/11/2011.

6 comentários:

  1. Infelizmente casos como este estão se alastrando por todo o país!

    Marcelo fernandes.

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  2. Boa tarde Jorge,
    Concordo que é horrível este nosso patrimônio histórico estar caindo e nada ser feito.
    Mas, como já escrevi certa vez para o nosso jornal, apesar de não terem publicado, penso o seguinte:
    Sou dono de uma empresa, pago meus impostos em dia, tenho várias famílias a sustentar através dos salários que pago referentes ao trabalho de todos, certo dia adquiro um imóvel para expansão do meu negócio e quero fazer as devidas reformas e demolições necessárias para esta expansão, mas descubro que o imóvel não pode ser demolido, em fim, caso Eu seja dono deste imóvel eu com certeza iria ficar fazendo o que a empresa de transportes está fazendo, alguém vai pagar a conta de uma adaptação para que seja possível unir o valor histórico à necessária adaptação ao meu empreendimento?
    Com certeza é muito mais caro, restaurar e adaptar a construção a minha necessidade que derrubar tudo e fazer um prédio novo para os meus propósitos.
    Não tenho ligação com a empresa ou coisa parecida, nem uso os serviços que ela presta, mas como empresário de outro ramo de atividade compreendo a situação.
    Abraços e espero que deixe este contraponto para q as pessoas vejam que existe um outro lado.

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  3. Ótimo espaço! parabéns pela ação :)
    www.marcelodubai.blogspot.com.br

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  4. Bom trabalho Stocker !
    Já assinei tempos atrás !

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  5. Muito triste...e o PT? nao faz nada? que administraçao é essa, de um partido que disse que iria cuidar bem da educaçao e cultura...amigos petistas, preservar a história e´educaçao e cultura...Maria Liege Hidalgo

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  6. Não sou arquiteto, mas já morei em São Leopoldo e a casa, que sempre me chamou a atenção, encontra-se precária há décadas. Poderia ser um belo anexo da Biblioteca, ou sede da Secretaria da Cultura, mas...

    Antônio da Silva

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